Thursday, September 30, 2010

Trair-se a Si Mesmo

Esta é uma das frases que está na moda.
Desde há uns anos para cá iniciou-se uma moda de culto generalizado da personalidade, aquilo que tanto se criticou (com justiça) em todos os ditadores passados e presentes. Diga-se, contudo, que, pelo menos, esses mesmos ditadores tinham alguma preponderância, positiva ou negativa mas ainda assim preponderância.
Hoje, vivemos numa comunidade que se vê individualmente como especial, líder e acima do próximo e, como é natural, se todos se acham superiores ao próximo e se todos somos o próximo...

Então, este trair-se a si mesmo é o desvalorizar de tudo o resto, é o mesmo que dizer que de toda a merda que eventualmente tenha sido feita e de toda a devastação causada a pior é a auto infligida.
Se é verdade que também eu sofro de egoísmo (que me parece atroz mas quando comparado com isto...) não é menos verdade que sempre que faço disparates parece-me fazer todo o sentido que seja eu a sofrer as primeiras e, se possível, as últimas perdas e não os outros. A responsabilidade é minha, fui eu quem fez e devo ser eu quem mais apanha...e sim, prefiro trair-me a trair os outros.

Esta gente vê esta forma de encarar o egoísmo como uma desculpa para fazer e desfazer, para se dar ao luxo de ignorar, por completo, quem consigo caminha porque, no final de contas, trair, enganar, fazer sofrer os outros é um mal menor e perfeitamente aceitável. E, o pior dos piores, é que isto deixou de soar a manifestamente estranho, começa a enredar-se e entranhar-se na normalidade.

Meus amigos, o princípio do todos é exactamente igual ao de nenhuns.
Se olhares à volta e vires que todos, como tu, se acham especiais é altura de perceber que nenhuns o são.

Tuesday, September 28, 2010

Este fim de semana tive um casamento.
É verdade que não gosto de casamentos nem de qualquer tipo de festa que inclua muita gente. Muita gente deixa-me confuso, muita gente faz-me sentir perdido e faz aumentar exponencialmente tudo aquilo que me leva a acreditar que sou inadaptado ao social comum.

Mas, neste caso em concreto, surgiram revelações que muito me agradaram.
As pessoas que conheço há mais anos do que o que gostava de me lembrar parecem-me melhores pessoas agora do que o eram antes. Talvez seja uma questão de idade, é muito possível que o seja, mas, hoje, parecem-me mais ponderadas, mais atentas, mais solícitas, ou seja, como disse, melhores pessoas.
Acredito ter alguma influência nisto. Acredito que antes fossem piores apenas aos meus olhos. Não é provável mas é possível. Hoje, também eu sou mais atento e solícito (não digo o mesmo quanto à ponderação) e, talvez por isso, também eles o sejam em relação a mim.

Gostei de mais gente do que esperava gostar e, ao que parece, também gostaram mais de mim.
É verdade que o correr do tempo implica a triste sina da velhice mas não é menos verdade que, quando as coisas correm bem, também nos torna mais próximos dos outros.

Thursday, September 23, 2010

Tenho uma relação relativamente difícil com o meu nome.
A primeira dificuldade que encontrei foi o facto de não o ter escolhido. É verdade que houve uma enorme sagacidade na sua escolha (etimologicamente fica-me bem, apesar de tal ter sido manifestamente acidental) mas gosto pouco que me imponham o que quer que seja e o meu nome foi-me imposto.
A segunda dificuldade é que, curiosamente, nunca foi extensivamente usado. Contrariamente ao normal, são os meus familiares mais próximos que me tratam pelo nome. Menos curiosamente, também profissionalmente sou tratado pelo meu nome mas a quase generalidade das outras pessoas com quem convivo usam outra forma de me tratar.

Como se constata, por exemplo, deste blog, não uso o meu nome. Não é caso virgem e, na verdade, uso mais alguns heterónimos e alguns outros lugares. Não serve apenas como escudo para a minha vida privada (apesar de também servir para isso), é uma forma de me assumir como sou despido e, para esse efeito, o nome que me deram não serve.

Deverei, contudo, assumir que já tive de controlar uma avalanche de outras pessoas que são todas elas eu, uma quantidade bastante assinalável de ramificações que me começaram a confundir.

Eu sou todos mas quando esses todos se juntam chego a perder-me.

Tuesday, September 21, 2010

Há uma corrente largamente seguida segundo a qual quando estás bêbado fazes aquilo que realmente queres e não o que a bebida manda.
É mentira. Sei-o por experiência própria. É mentira.

A maior evidência, para mim, de que essa filosófica corrente está errada prende-se com o simples facto de que se tal fosse verdade o dia seguinte não seria tão difícil. Ou melhor, não seria tão mais difícil.
A verdade não faz com que nos detestemos. O destruir, em segundos, o que levamos anos a construir não resulta da sinceridade mas da estupidez.

Pensar que a bebida é o elixir da verdade é tão parvo como pensar que a realidade é mais clara sem óculos quando somos, manifestamente, míopes.

Parvoíces, só isso.

Thursday, September 16, 2010

Quem mais próximo do impossível chegou foi Lucky Luke; é mais rápido do que a própria sombra mas, ainda assim, não a consegue despistar. Sim, será uma pequena vitória quando comparada com o objectivo final, contudo é mais do que qualquer um de nós consegue fazer.

Perante a impossibilidade da fuga, temos algumas teses de como lidar com o que nos persegue todos os dias da nossa vida.

Se pensarmos em tempos idos chegamos à conclusão de que a superação será a resposta. O iluminismo fala-nos da constante evolução, do ultrapassar limites que, teoricamente, não existem. Ora, face à impossibilidade de nos evadirmos deveriamos tornar a nossa sombra mais esbelta, mais leve, mais etérea, mais ideal.
Não resultou, como se sabia à partida que não iria resultar. A virtude terá sido a de sermos perseguidos por algo mais bonito e menos incomodativo mas, como a história atesta, muitos dos iluminados terminaram a cortar partes do corpo, na miséria ou no suicídio.
Afinal de contas, de tanto modelar, aperfeiçoar e desenvolver o que se conseguiu foi saber mais sobre a sombra e, quanto mais se sabe, mais escura ela é.

Hoje, se ligarmos a televisão, somos confrontados com uma outra teoria. Teoria essa que nada mais é do que parva.
Desde os talk shows até aos artigos de opinião a linha dominante é a de nos aceitarmos. Tornarmo-nos confortáveis connosco mas...uns segundos depois, para isso acontecer, temos de plantar árvores, emagrecer, ser vegetarianos, amar todos os animais (incluindo ratos e baratas) e ser tolerantes com o próximo (ainda que, a esse mesmo próximo, apontemos todos os defeitos de que nos lembramos para que, dessa forma, lhe seja difícil aceitar-se a ele mesmo).
Se os iluministas eram iludidos estes de agora são só parvos.

Solução?
Bem, se a tivesse escreveria um best seller e, sem dúvida, ainda receberia, por atacado, um Nobel.
Para quem vê de fora, a minha atitude quando ao meu convívio com a minha sombra não mudou: a minha sombra é parte de mim e, por isso, está o mais perto da perfeição possível.
Interiormente, contudo, já mudei algumas vezes de atitude. Neste momento, começo a tolerá-la mas, há uns 3 ou 4 dias, odiava-a e, por isso, odiava-me.

Se pudesse, em muitos momentos da minha vida, escolheria noites de lua nova para viver. Era a maneira de resolver o problema.

Thursday, September 09, 2010

She

Não tenho pena dela, não é pessoa de quem se deva ter pena.
É a minha mais antiga raiz, é quem sempre esteve lá, tanto em tempestades como em dias solarengos. Sobreviveu a tudo e, algumas vezes, sobrevivi com ela, o meu farol quando o nevoeiro nem à faca se consegue cortar.

Infelizmente, não teve a sorte que eu tive e que ela merecia bem mais que eu.
No meio de todo o turbilhão de sentimentos e actos que são os meus dias, no meio desta confussão bem mais pejada de adagas do que flores que é o meu desiquilíbrio quando estive romanticamente acompanhado estive romanticamente bem acompanhado.
De uma forma pouco explicável ou justa, as minhas mulheres eram minhas, totalmente minhas. As minha mulheres abraçavam-me e, dentro do que lhes era permitido pelo meu pavor de gostar, estavam coladas à minha pele. Eu era tudo e só assim admito que seja.

Ela, pelo contrário, teve muito mais azar do que eu.
Ela não é tão cínica, não é tão fechada, não é tão avessa a gente...e gente que ela permitiu que, romanticamente, se aproximasse, não foi merecedora disso.
O que me preocupa, no fundo, é que a cada prego que lhe espetam a aproximem mais de se tornar num marasmo como eu, numa natureza limitada a areia e a um cacto perdido de tempos a tempos. O que me preocupa é que ela decida que não precisa de tantas cores na sua paleta, que chegue à conclusão de que o cinza e o preto são mais do que suficientes para delinear as fronteiras e que deixe o meio por pintar.

Lamento este mundo. Lamento que seja aleatório ao ponto de não escolher quem deve ser poupado à realidade estéril. Lamento que a verdade seja de chumbo e não de plumas.

Há um ditado antigo que diz assim:
Quando o mar bate nas rochas quem se fode é o mexilhão.
Ora, eu fiz e faço de tudo para não ser o mexilhão mas isso tem os seus custos, não sinto a água do mar.

Relembrei, esta semana, o motivo pelo qual não confio nas pessoas, ou melhor, o motivo pelo qual tenho muita dificuldade em confiar nas pessoas.
Há umas 3 semanas descobri que uma amiga de uma amiga (que conheço mas que não é minha amiga) tinha sido pedida em namoro (?!) pelo tipo que a andava a comer há coisa de 2 dias (?!).
Se pensam que isto basta, enganam-se, só piora.
Ela tem 30 (acho) e ele tem 33 (acho) e já foi casado.
Quando soube disto, apressei-me a dizer que esta gente é doente e que não me apanhavam, nem amarrado, numa situação destas.
Como se tornou habitual, chamaram-me cínico e outro tipo de elogios. Porque eu não acredito em nada, porque eu julgo sem, sequer, conhecer, porque sou de outro planeta...enfim.
Depois disso, cruzei-me com eles numa festa da minha amiga e, sem querer, ouvi-a dizer-lhe qualquer coisa como "esta casa não te dá ideias?". Arrepiaram-se-me todos os pêlos do corpo e, mais tarde, descobri que ela tinha conversado com umas pessoas sobre o facto da casa dela ser pequena para os dois e, pasme-se (ainda mais, se possível), já andava a ver outras.
Bem: ele foi-se embora (não mora em Portugal) e ter-se-á despedido dela com uma coisa do tipo "bem...vamos ver...vivemos longe um do outro...".
Sim, esta gente é doente. Muito doente.
Uma, sente-se compelida, social e familiarmente, por ventura, a arranjar um gajo, seja ele quem for, e não vê os sinais de aviso como...pedir em namoro gente com mais de 30 anos.
Ele, segundo me pareceu, é do tipo que diz amo-te muito se isso for a chave para as calças dela.
É o reino das trevas e, por isso, Loki preside ao texto.