Saturday, June 20, 2015

VULGARIDADE


O termo Vulgar como aqui o uso não tem nada de pejorativo. Uso-o com a finalidade com que foi criado, algo normal, corriqueiro, ordinário.

Eu queria ser mais vulgar, eu queria passar mais despercebido, eu queria ficar com as cores mais esbatidas.
É compreensível a confusão que este tipo de afirmação produz em quem me vai conhecendo ou lendo ou qualquer coisa do tipo. O meu comportamento é contraditório com a minha vontade e assumo-o sem grandes problemas mas a minha vontade é ser mais como toda a gente.
Aliás, posso dizer, até, que é uma tentativa constante a de ser mais comedido e dizer menos e fazer menos e compreender mais e resignar mais e respeitar mais. Tudo tentativas que não têm sido particularmente bem sucedidas mas de que não desistirei apenas por isso.

Por exemplo,
quando o Jesus diz que sabe que vai ganhar a Champions (algo que o Vítor Pereira também disse) quer-se dizer extraordinário mas como isso muito dificilmente acontecerá é só parvo;
quando o Mourinho diz a mesmíssima coisa quer-se dizer extraordinário e isso já aconteceu e acontecerá, provavelmente, mais vezes e, por isso, não é parvo.

Hoje em dia toda a gente sabe coisas que vão acontecer e entendem como verdadeiramente relevante aquilo que pensam e sentem; não quero retirar o valor intrínseco, para o próprio, dessas suas coisas mas a mim e à humanidade o que interessa isso?
Estamos na era da individualidade fictícia que uns tentam exteriorizar com a cor do cabelo, outros com unhas de gel, outros com a forma como se sentam, outros com afirmações desmesuradas de interesse que não têm...
....e a cor do cabelo, as unhas de gel, a forma como se sentam e as afirmações de interesses são todas iguais entre si, o que as torna, you guessed it, Vulgares.

O meu interesse é outro.
Eu gostava de ser mais relaxado, trabalhar menos, importar-me menos com vitórias e derrotas, incomodar-me menos com a burrice alheia, enfim, tolerar e acomodar-me mais ao mundo que me rodeia e que sinto, muitas vezes, estar mais adaptado aos outros do que a mim.

Eu queria tudo isto mas não me sinto capaz.

Quando estou a pensar que o sucesso está a chegar, dá-se qualquer merda que faz com que o verniz estale e venha ao de cima o que eu sou e não o que quero ser.
Uma vez, numa discussão sobre a temática, disse: é mais ou menos assim: quando penso que estou a chegar onde quero falho e parece-me a mesma coisa do gajo que julga que sabe nadar mas quando entra, mesmo, na água descobre outra coisa...fodeu-se.

É um bocado assim...e é um bocado querer-se o que não se tem, coisa que me deixa nervoso.
Eu acredito nisto tudo, eu penso isto tudo, eu quero isto tudo...e depois o que acontece?

Bem,
no meio de uma conversa sobre cenas, estávamos a falar do impacto que temos na vida das pessoas e naquilo que representamos para elas.
Aquilo que vivo parece-me normal porque é o que vivo e nunca vivi outra coisa. Mas é quando confrontados com experiências de outros que não os próprios que conseguimos aferir da vulgaridade ou da falta dela.

Quando estava a contar meia dúzia de coisas olharam-me com alguma surpresa porque, aparentemente, o que fizeram por mim, o que fazem por mim, o que estão dispostos a fazer por mim (com reciprocidade, suponho) não estava ao alcance dos meus interlocutores. Não lhes tinha acontecido o que me acontece com relativa facilidade.
Quem falava comigo achava que era uma maravilha, tudo isso; que era óptimo ter isso tipo de efeito; que teria de haver um motivo forte para me quererem tanto e tanto bem, ainda que não muitas pessoas.

...e voltamos à vulgaridade:
Vamos imaginar que o extraordinário sou eu e que quem admirou a minha extraordinabilidade é vulgar.
Os que admiram estão, provavelmente, agora a fazer coisas vulgares com a sua ou o seu cenas, estão a ver os ponteiros passar por eles, estão a perder tempo a ler isto que escrevo, enfim, estão a viver a sua vulgaridade ao passo que eu, esse ser extraordinário, está a trabalhar porque não tem mais o que lhe apeteça fazer e olhar para relógios chateia-me.

Podendo escolher, se honestidade houvesse ou se o politicamente correcto de hoje fosse uma outra coisa, quem preferiria ser mais mas sozinho do que menos em companhia se tal não fosse patológico?

...E O EXEMPLO ACABADO

Entre a penúltima linha e a presente passei 45 minutos ao telefone.
O que aconteceu?
Tenho um plano para hoje. Há duas coisas que decidi fazer sendo que uma delas já está resolvida, de momento, por impossibilidade de fazer mais.
O tempo está um sonho e ontem não dormi quase nada.

No telefonema, quem me pediu para fazer uma das coisas - que não tinha de ser para hoje mas que decidi fazer hoje - pediu-me, expressamente, que deixasse de lado e que fosse apanhar Sol ou dormir; se de Sol não estou muito necessitado, de dormir, estou.

Não! Há um plano. Disse-te ontem que ia fazer isto hoje. Não me interessa se está Sol ou se estou cansado por ter dormido pouco. O plano vai ser seguido!

À custa de quê?
Não interessa. Há um plano!

Admirem porque é a estoicidade que ganha.
Riam porque há quem queira fazer outra coisa e não consegue.
Vivam melhor com os prazeres simples e mais despreocupados que a vulgaridade permite e desejem-me o mesmo porque ficarei agradecido.

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