O Estranho
Quando tenho conversas francas e honestas sobre as minhas coisas tendo a dizer sempre que acho e raramente que sei.
É verdade que a minha opinião em relação à generalidade das pessoas com quem nos cruzamos é que tendem a usar o verbo achar para evitarem comprometer-se; achar dá sempre para, depois, dizer ah, eu não disse que tinha a certeza...foi só uma opinião... e isso chateia-me. Cobardia chateia-me sempre.
Então, por que uso eu o verbo achar com algo tão pessoal como eu?
Na série The Crown o Churchill abdicou da sua posição de Primeiro Ministro não por ter sido interpelado para o efeito por toda a gente que respirava mas porque viu o resultado final do quadro que lhe pintaram e viu, nessa altura, o velho frágil a quem a saúde tinha escapulido.
Sim, todos lhe tinham dito isso;
Sim, ele tinha uns quantos espelhos;
Não, ele não tinha realizado que o velho que aparecia no quadro era ele até o ter visto.
(não é certo que isto seja verdade porque é uma versão televisiva da cena mas, para mim, é verosímil).
No dia anterior ao que descrevi, vi umas fotografias minhas que me tinham sido tiradas nesse mesmo dia e, quando olhei para elas, dei conta que sou manifestamente maior que as pessoas que me rodeavam; mais pescoço, mais braços, mais ombros, mais peito e (com uma excepção, acho) mais barriga também.
...não tinha dado conta disso mas assim visto era manifestamente óbvio, pelo que me senti estúpido.
Fez-me lembrar, há uns tempos, quando disse a um amigo foda-se, aquela gaja tem uns braços tão grossos como os meus... ao que me foi respondido pá, tu só podes estar a brincar...
Ora,
se o Churchill não se conseguia ver velho e era;
se eu não me consigo ver maior do que os que me rodeiam e sou...que esperança podemos ter de perceber o que não aparece em espelhos nem em fotografias e nem sequer em quadros?
Presto muita atenção aos meus actos e ao que considero ser o meu eu mas...quando nem sequer o diâmetro dos meus braços consigo diagnosticar com clareza e acerto...
Voltando onde se começou:
o meu acho nestas coisas significa tenho tanta certeza quanto consigo ter e não talvez; esta minha apreciação não é de coninhas mas antes de um gajo que sabe que pode mesmo não estar certo.
E além disso, este meu acho, para não ser mal entendido, está restringido a, como disse, conversas francas e honestas.
Em conversas correntes com gente que não conheço tão bem como gosto de conhecer e que não me conhece tão bem como gosto que me conheçam não há achos porque esta é uma nuance que não quero deixar à descrição e que não tenho tempo para explicar.
E agora, ajoelhem perante a beleza que é o Stormy Monday dos Allman Brothers em 71:
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