Thursday, June 11, 2015

Mentiras 1.000 Vezes Repetidas

Diz-se muitas vezes que uma mentira 1000 vezes repetida não faz com que se torne verdade mas é, por vezes, muito duvidoso que assim seja. 
A discussão é relativamente esotérica mas, em termos práticos, muitas das vezes nem sequer interessa se a mentira é uma mentira porque, em termos palpáveis, o resultado é mais importante e quando se acredita na mentira o resultado é o mesmo que se da verdade se tratasse.

Imaginem, por exemplo, que o vosso marido/mulher/namorado/namorada/cenas era visto (ou mesmo fotografado) a entrar numa casa ou num quarto que não o próprio de mão dada com uma pessoa do sexo oposto e que saía um par de horas depois, também com registo fotográfico.
Ele/Ela dizia-vos que a pessoa com quem estava se tinha sentido mal e que por isso a levaram para seja lá onde e teria sido, também, por isso que entraram de mão dada, porque a pessoa precisava de apoio.
Aqui, acreditarão ou não mas o favor de ser verdade ou mentira é menos relevante porque vocês acreditarão no que quiserem, não obstante o mais provável é que seja mentira.
A maioria das pessoas que acreditassem na estória viveriam com um par de cornos mas...novamente, se não souberem que diferença faz?

O pior, contudo, é quando mais do que o resultado a mentira em si torna-se verdade.
Imaginem, por exemplo, que estão a falar com alguém na rua e que, depois, chega um amigo; a boa educação obriga a que o apresentem mas quando o fazem o vosso amigo, surpreendido, pergunta a quem está a ser apresentado se ninguém lá está...
Neste cenário, está mesmo lá uma pessoa; neste cenário, o vosso amigo vê mas finge não ver. Multipliquem, agora, isto mesmo por 1000 pessoas, 1000 pessoas que afirmam ninguém lá estar, que vocês estão a alucinar...mas não estão, a pessoa está lá.
Quanto tempo demorariam a ficar malucos quando não estão malucos?

Isto é uma coisa imaginada e que implica coordenação; é um exagero. Mas pensem em coisas simples.
Quantas vezes aguentarão que vos digam que são burros até começarem a acreditar que o são? Quantas vezes aguentarão que vos digam que são horríveis até começarem a acreditar que o são? Quantas vezes aguentarão que vos digam que são uns monstros até começarem a acreditar que o são?

Estes cenários, contrariamente ao primeiro, acontecem todos os dias e em todo o lado. 
Às vezes são criados por quem vos quer bem mas não sabe fazer melhor, outras vezes por quem não gosta de vocês e vos quer fazer mal e, provavelmente o pior de todos, por pessoas que gostam de vocês mas que precisam que vocês se sintam mal para que percebam a sorte que têm por alguém vos aturar e gostar de vocês apesar de todos esses defeitos horríveis...que não existem.

Não sou invulnerável a este tipo de coisas mas - como me canso a mim mesmo de dizer - porque sei que existem estou atento e tento defender-me o melhor que consigo; o que, por seu turno me deixa vulnerável a mim mesmo.

Hoje disseram-me: tu achas que és pavão mas eu não acho isso de ti.
Respondi da mesma maneira que respondo quando a coisa não é tanga, com seriedade e com a verdade como a vejo: Eu não me acho pavão, eu acho-me realista. Tenho a mesma facilidade - se calhar não a mesma mas mais - em ver os meus defeitos e assumi-los, o mesmo acontecendo com as virtudes. O que acontece, muitas vezes, é que porque acho, por exemplo, que sou esperto e não tenho problemas em assumi-lo quem ouve tende a achar que é o mesmo que ser pavão.

Dito isto, contudo, seria injusto não assumir que se eu fosse a única pessoa a achar-me inteligente alguma coisa tenderia a estar errada e, provavelmente, se um número suficiente de pessoas me dissesse que sou burro enquanto crescia talvez eu acreditasse e, talvez, ficasse efectivamente burro.

É assim que nascem pessoas traumatizadas.
É assim que crescem pessoas com uma imagem que tendem a completar com o decorrer dos anos (que nunca terá sucesso, que nunca ninguém o há-de querer, que nunca será feliz, que nunca fará ninguém feliz, que nunca será suficientemente bom).
É assim que se perpetua um ciclo e se cria uma sociedade medíocre porque a mediocridade é alimentada mesmo quando lá não está.

....e é assim que uma das minhas poucas virtudes se torna um bem escasso e muito procurado:
Eu não deixo que pisem quem me acompanha.
Eu não alimento traumas injustificados e arranco-os, nem que seja à pancada, às pessoas com quem me preocupo.
E é assim que pelo meio do pântano que é a minha esquisitice algumas pessoas se tornam naquilo que não e não naquilo que lhes disseram que eram.

Um exemplo muito fútil mas nem por isso menos importante disso mesmo é o seguinte:
A minha primeira namorada tinha umas mamas (pensei escrever peito mas eu não penso peito) maravilhosas e depois descobri que não gostava delas porque lhe tinham enfiado na cabeça que não eram elegantes, não eram de senhora.
Passou-lhe. Algum tempo depois, mais do que não gostar passou a gostar; passou a preocupar-se com os sutiãs que usava porque queria que lhe ficassem bem e não que a achatassem, porque eu gostava, porque havia motivos para gostar, porque eram, de facto, maravilhosas.
Ficou a ver-se de uma outra maneira mas não de uma maneira distorcida, ficou a ver o que lá estava. Apenas isso.

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