MEDO e CENAS
MEDO
Há uns dias uma amiga contou-me que o seu gajo achou que tinha ouvido um barulho em casa, à noite, e instou-a a ir ver.
Lembrei-me que a diferença entre esse gajo e eu não é de monta nem de génese, é outra.
Há uma síndrome que impede que quem dele padece sinta dor.
Isto visto desarmadamente parece um sonho, poucas coisas hão-de ser mais fixes do que não ter dor mas, como com frequência acontece, fala-se antes de se pensar.
Estas pessoas não sabem que se estão a queimar, não sabem que têm uma perna partida nem outras maleitas que, quando não detectadas, podem levar a desfechos muito desagradáveis (não me lembro se a insensibilidade à dor traz a companhia da insensibilidade ao prazer mas não me parece difícil imaginar que assim será).
O que tem isto que ver com o início?
Bem,
ter medo não é esquisito nem sequer é mau.
Voltando à história, também eu de vez em quando ouço ou julgo ouvir cenas na escuridão da noite e também eu fico desconfortável com isso. Não me agrada - bem pelo contrário - achar que vou sair do quarto e levar uma paulada ou um tiro. Não é fixe.
Pessoas insensíveis ao medo sofrem de uma patologia parecida com a que já descrevi, não é normal, não é saudável e não faz delas heróis ou heroínas; faz delas doentes.
É muito interessante ponderar-se se quem não sente medo é passível de ser considerado como herói porque a heroicidade é um conto de superação.
...e novamente Eu:
o que me distingue de alguns e alguns de mim é que ter medo chateia-me e não gosto de coisas que me chateiem.
Se ouvir um barulho posso estar a borrar-me de medo mas vou!
Se saírem dois manfios do carro para me atacarem percebo que a coisa não será, provavelmente, agradável mas vou!
Quando praticava desporto e tinha de me deslocar a um campo onde iria ser apedrejado odiava mas ia!
Eu tenho e sinto medo mas não em rendo nunca!
Muitas vezes confunde-se com ausência de medo mas não é. Ele está lá. Ele assusta-me mas não me paralisa.
O medo - como tudo que me rodeia - deve perceber que me pode ganhar mas vai dar trabalho e tem de estar disposto a apanhar.
CENAS
Como é mais ou menos fácil de ver, tenho dificuldades com medidas e tenho, ainda, dificuldades em que as minhas opiniões sejam entendidas como outra coisa que não ordens.
Percebendo as bestialidade disto e não gostando do efeito que estas duas características provocam, tenho um imenso cuidado para não engolir mas, de vez em quando, o sangue aquece e vai tudo com o caralho. Porque como tenho dificuldade com medida, quando me irrito tendo a não me irritar um bocadinho e as coisas que poderiam irritar-me só um bocadinho (ou nada) passam a irritar-me muito!
O que tem graça, no meio disto, é o seguinte:
Gente com uma personalidade manifestamente mais doce que a minha tende a tentar fazer de propósito o mesmo que eu evito.
Gente que viaja um bocado mais com o vento do que eu tende a ter mais opiniões sobre o que os outros devem ou não fazer e devem ou não vestir.
Não saberei dizer se é uma manifestação de insegurança mas...é esquisito...
Lembrei-me disto porque, há momentos, alguém me disse que tinha de sair e pediu-me para avisar um gajo. Perguntei-lhe isto: está tudo bem? porque queria saber se estava tudo bem mas não queria, nem quero, saber mais nada porque não tenho nada que ver com isso e ninguém me deve satisfações.
Foi-me respondido que estava tudo bem e, depois, uma tentativa de me dizer por que motivo tinha de sair...coisa que, como disse, não é da minha conta e que disse não querer saber.
Eu sei que isto parece áspero mas só parece porque pouco comum.
As pessoas querem saber coisas para se sentirem importantes, para sentirem que controlam...e eu não. Eu que sou muito mais controlador, de facto, do que a maioria.
Talvez seja o Medo com que começou este post ou talvez seja outra coisa mas, regressando, o que é engraçado é que o meu medo de engolir é semelhante à vontade de engolir de gente que tem uma boca muito mais pequena que a minha.
....e há um motivo que poderá ser egoísta para eu tentar ser aquilo que descrevo e não o animal que se esconde debaixo desta fina camada de verniz:
Se me deixarem engolir e fazer desaparecer o que antes existia eu deixo de ter interesse. Eu QUERO que a pessoa exista. Eu QUERO que pessoa lá esteja. Eu NÃO ME QUERO porque se me quisesse já me tinha e a vida seria uma puta de um inferno.
E ROCK N ROLL, BITCHES!
0 Comments:
Post a Comment
<< Home