O Sol Nascerá!
Não tenho um osso de new age nem de místico no meu corpo, ou pelo menos é o que acho...
Falar de energias e karma dá-me um bocado de náuseas, pelo que evitarei os termos mas, nesta altura em que escrevo, sinto-me como aqueles gajos que chamavam e chamam milagres ao que não tinha ou ainda não tem explicação científica.
Os dias e as alturas nem sempre são boas mas tenho muitas dificuldades em reconhecê-lo porque me faz sentir uma vítima que não sou e as mais das vezes as coisas correm mal por motivos que são perfeitamente visíveis mas que ignoramos e, pior dos piores, por motivos perfeitamente visíveis e que optamos por ignorar.
Ora, apesar de não o reconhecer, quem já me viu nu tem mais facilidade em ver que estou com o céu mais nublado que o costume e, para essas mesmas pessoas e pelos mesmos motivos, tenho menos vontade de o esconder; quem já me viu vulnerável faz-me menos confusão que veja novamente.
- Foda-se, que queres? Foi agorinha. Podes dar-me um par de horas?!
- Ai, K... é o karma, meu filho! Sofre! (isto parece agressivo mas é uma tentativa de me fazer rir, o que aconteceu)
- Pá. Posso ter um desgosto por uns momentos? Dá?!
- Se dá? Então não dá! Podes apaneleirar o tempo que quiseres. Olha, o meu maior desgosto foste tu e, ainda assim, aqui estou. Pelos vistos, não me passou!
(vejam como sou mesquinho: não desejo nem nunca desejei ser o desgosto de ninguém mas, só para não haver mal entendidos, se é para ser que seja o maior!)
Umas horas depois, ligam-me para ir ver um filme nomeado para os Oscares.
Ok, disse e pendei não é má ideia um gajo distrair-se...
Na mesma altura, lembrei-me que se passa uma cena às terças à noite que ando a querer fazer há muito tempo mas que tenho evitado porque beber no início da semana e dormir pouco - não interessa quanto bebo nem quanto durmo...dá-me cabo da semana - , mas como ia estar na rua e ia, aproveitava e checava o que se passava.
Porque não quero mal-entendidos: ia lavar-me em porcas!
E agora, a descida pela toca do Coelho:
O filme não tinha sido nomeado para os Oscares agora mas em 1994;
O filme era Macedónio e falado, suponho, não posso jurar, em macedónio e albanês.
Resumo: Terça-feira à noite, um filme Macedónio.
Quando entrei na sala, dei conta que lá estava a minha primeira Ex e a melhor amiga dela, gente com quem me dou muito bem e de quem gosto mas como o meu ânimo não estava como deveria estar fingi não ter visto e segui para o meu lugar.
Segundos depois, a amiga dela (que já não via há, seguramente, 10 anos e cuja história hei-de contar porque vale a pena) veio ter comigo e fez a festa que contava que iria fazer, causando algum desconforto a quem estava comigo. Já viste quem está comigo, K? e eu olhei para trás e fingi-me surpreendido (não vai há muito que falei com ela mas vê-la deve ter uns 2 anos).
Fui dar duas de letra e ela (a Ex) ficou muito nervosa, como é mais ou menos costume.
E o filme ia começar: Falamos mais depois.
Terminado o filme, fui lá despedir-me (e perguntar pelos Pais dela, tinha-me esquecido e pesava-me na consciência) e a amiga pediu-me o número para não perdermos o contacto outra vez. Ditei-o e ela perdeu-se a meio do caminho tendo o resto sido ditado pela minha Ex.
Ainda sabes o número de cor? perguntou-lhe a amiga e ela não respondeu.
Saí de lá contente e não me fui lavar em porcas, o que a minha semana agradece.
Poder-se-á pensar que o meu ego já tinha sido massajado o suficiente, por um dia e talvez seja mesmo isso.
Na minha cabeça, contudo, o que se passou foi mais isto:
Poderia tornar-me daqueles gajos ridículos e amargos que fingem não querer o que não têm. Poderia vir para cá ou para outro lado dizer que o que prefiro é estar sozinho porque as pessoas são umas bestas (o que até seria corroborado pelo nervosismo de alguém casado e com filhos).
Não o farei. Não seria verdade.
A verdade é esta: não prefiro estar nem ficar sozinho mas não terei companhia a qualquer custo. Imaginar a mediocridade é-me infinitamente mais doloroso do que a solidão.
Confirmo que o resultado não é bom, as evidências revelam-nos mas o que acontece e quando acontece é extraordinário. Sou o maior desgosto de uma, outra disse (espero que tenha sido só dizer) que me queria matar, outra não consegue não ficar com borboletas no estômago sempre que me vê e também não o consegue disfarçar e outra está apaixonada há 20 anos...
Isto que descrevo não me infla o ego por ter gente que assim reage ou reagiu comigo. Quero o melhor para elas e, obviamente, o melhor não sou nem fui eu.
...e é muito reconfortante: às vezes duvidamos do que fazemos e em momentos desagradáveis sentimos que tudo que se fez foi mal feito e que deveríamos ter sido outros a fazer outras coisas...
Eu não fui feito para me dar bem com o normal e ter o normal não é um preço que pretenda pagar.
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