Wednesday, November 02, 2016

Lupa (vai demorar...estou com tempo)

Ninguém fica bem quando visto à lupa é algo que ouvi há muito tempo e nunca mais me saiu da memória, por mais motivo que um.
O principal é que ao ser uma verdade universal dá para atirar a quem quer que seja que julgue outros pelo que quer que seja e eu uso isto mais como arma de arremesso do que outra coisa qualquer.
Esta frase, contudo, tende a ser eficaz quando o que se critica não é o mesmo mal de que a pessoa que aponta o dedo padece. 
Por exemplo, o bravo que desdenha da cobardia de outro e que tem uma outra característica não aprazível em que deveria trabalhar.

Também eu fico mal quando a lupa se aproxima, por isso tenho (algum) cuidado com isto, cuidado esse que vai de vela quando me irrito.

Lembrei-me disto não por causa da Lupa mas por causa do espelho.

Já ouvi gente muito chata a chamar chata a outra pessoa;
Já ouvi porcas a chamarem porcas a outras pessoas;
Já ouvi mentirosos a chamarem mentirosos a outras pessoas.
Poder-se-ia pensar que todas estas são pessoas de fraca índole mas não me parece ser o caso, na maioria das vezes.
Os chatos não sabem que são chatos;
As porcas não sabem que são porcas;
Os mentirosos não saem que são mentirosos.
Isto, assim dito, parece parvo mas pensem nisto:
A maioria de nós encontra razões quando nem sempre as há.
Se disserem à chata que é chata ela dirá que foi chata porque...
Se disserem à porca que é porca ela dirá que foi porca porque...
Se disserem ao mentiroso que ele é mentiroso ele dirá que foi mentiroso porque...

Entendem?
Não são como aqueles que apelidaram do que quer que seja.
No caso dos próprios, eles foram o que foram e fizeram o que fizeram porque havia um qualquer motivo que os impeliu a tal.
...e não é isso que acontece sempre...

Eu não me vejo assim e por isso tenho problemas com o espelho.
Volta e meio encontro características minhas noutras pessoas e fico extremamente desagradado. Não justifico o que poderei ter em comum ou o que farei em comum com banalidades circunstanciais quando não vejo que assim seja.
As vezes em que mais fico abalado são aquelas em que as características que vejo nos outros me são estruturais.

Em sentido inverso ao de tentar justificar o porquê de ter feito aquilo, procuro não me colocar em circunstâncias que me empurrarão para o ser.
(eu sei que isto parece o mesmo do fiz porque mas não é. O fiz porque leva a uma linha de pensamento em que a envolvente especial levou a tal coisa mas, no meu caso, qualquer envolvente me levará a fazer o que quer que seja. Não é o meio, sou eu!)
Já por aqui disse que evito competição por ser demasiado competitivo. A linha de raciocínio é a mesma mas ligeiramente mais complexa.

Enquanto eu consigo evitar a competição quando de tal sou capaz - por ser uma decisão interna para fora - no caso dos demónios que se tentam enterrar nem sempre o consigo fazer porque é uma faísca que vem de fora e incendeia o cérebro reptiliano. Entro em automático e, por isso, é uma combustão interna ateada por fora.

Há uns poucos dias estive exposto a uma pessoa que julga ter toda a gente como devedora.
Essa pessoa entende que todos deveriam fazer isto e aquilo por ela mas nem sequer sabe o motivo ou, em último caso, inventa um.
- esta mesma pessoa queixa-se imenso da vergonha de pensão de reforma que recebe mas lembra-se menos que só trabalhou até aos 31 - 
O sentimento que ela tem eu também o tenho. Não é nem próximo, em termos de intensidade, mas é o suficiente para me fazer esgar de dor ao imaginar este ponto comum.
Fodeu-me o dia.

Há uma outra pessoa com quem tenho bastante em comum, tanto no bem como no mau.
Em tempos passados, disse-lhe:
Bem, eu poderia não estar contente com isso e decidir fazer alguma coisa mas não me diz respeito. Não vou fazer nada.
ao que me foi respondido:
K, não te diz respeito e não tens como nem porquê não estar contente.
...
É? Bem, então isso é o que vamos ver...
Viu. Não gostou. Ainda não gosta. Aprendeu que há cães maiores. Aprendeu que animais selvagens não são domesticáveis e nem sempre se pode contar que sejam domados.
(Como aprendeu, deixou de achar cenas. É triste ter de se apanhar para aprender e, com pena e vontade de melhorar, não sou de parar de bater.)
Bem...
este segundo caso é o de um gajo que se acha especial e, por isso, acredita não estar sujeito às mesmas regras que os outros. 
Este segundo caso acha que é cão grande e, além de achar, até é mas descobriu, como descobrem todos, que há sempre um cão maior...

Eu também acho que sou especial. 
Não tanto especial no sentido de achar que sou melhor e que não devo respeito a regras mas especial no sentido de pouco comum e que devo respeitar as regras por decisão e apenas por decisão.
Eu também acho que sou cão grande.
Além de achar, sou mesmo, mas não tenho ilusões quanto a haver maiores do que eu, por aí.

Parece um chorrilho de lamentos, eu sei.
Não é um chorrilho de lamentos.
Lamentar-me é um defeito que, felizmente, não me assiste.
O que isto é é uma maneira de tentar fazer das letras e das palavras um espelho para que esteja mais preparado para outros reflexos e, se tudo corresse como se quer, uma maneira de tentar fazer das letras a alteração estética que me afaste dos pontos comuns que encontro em alguns dos outros.

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