Monday, April 11, 2011

O que nos alimenta nem sempre nos entra pela boca. É verdade, ou assim me parece, que sem alimento no sentido mais literal do termo não sobreviveremos, o que não acontece com o seu equivalente metafórico.
Por isso, e antes de mais considerações, irrita-me ouvir gente dizer que sem isto ou aquilo morreriam; sejam livros, seja pintura, seja música ou outra coisa qualquer. Obviamente não morreriam sem arte mas é também óbvio que seria sempre um sobreviver diferente.

A arte não é suficiente para nos fazer viver mas é imprescindível para que essa vida, ou sobrevivência, tenha cor. Não tem que ver com sustento, tem que ver com prazer e, coisa manifestamente estranha, não raras vezes prescinde-se de algum sustento para ter alguma cor.

Confesso que sempre que me recordo de momentos felizes está lá alguma forma de arte. Sim, até um filisteu como eu tem alguma sensibilidade a este nível. E não digo alguma forma de arte no clássico portador de náusea de uma música que me lembra isto ou uma fotografia que me lembra aquilo. Não, nada disso. Não é a banda sonora ou um adereço de um qualquer momento, é o momento em si. Não corrobora com o que se passava, era o que se passava.

Lembro-me, por exemplo, do livro Madagáscar, do concerto dos Pearl Jam, no restelo, da bateria na Portela e no Salgueiro, do Magnólia e do Paris/Texas, apenas para citar alguns exemplos. Os momentos foram criados por eles e não empurrados para lá por uma qualquer lembrança de uma fêmea ou coisa que o valha. Isto, para mim, foram momentos de arte, momentos que se consumiram em si mesmos e não partilharam o seu espaço com ninguém.

É como a música de fundo, odeio-a. Ou me incomoda porque me atrapalha, quando é má, ou me incomoda porque me atrapalha, quando é boa.

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