Wednesday, August 12, 2015

Como se Criam as Pessoas

Às vezes, a ficha demora a cair e outras vezes não cai.
É injusto mas verdadeiro que somos o produto da nossa vivência e, em primeira análise, da criação que nos deram e mais injusto é que a culpa seja sempre de quem nos educou ou tentar educar.

Para se entender alguém é preciso conhecer e o mesmo se aplica quando somos nós em relação a nós mesmos.

Há muitos anos atrás, num jantar de família que englobava a minha namorada da altura, o meu Pai, a propósito nem consigo imaginar de quê, disse qualquer coisa como isto: O K, entre vocês os dois, é claramente o mais bonito!
Vamos esquecer que não há forma de se justificar dizer algo assim;
Vamos esquecer que se as pessoas são analisadas como um todo, ainda que fisicamente, e que se alguém, entre eu e ela, estava com alguém de um nível superior não era ela;
Vamos esquecer boas maneiras.

Na altura, achei parvo e mal educado mas nada mais que isso.
Agora, explica muitas outras coisas.

Quando tinha 18 anos, o meu Pai foi chamado à escola porque me portava mal. Era ridículo, tanto eu portar-me mal como ser chamado à escola o pai de um adulto, mas ele lá foi e já sabia ao que ia porque não minto nem me escondo, coisa que não é recente.
Confrontado com a minha insolência a roçar a má criação e pouco contente com ver as suas (e as minhas) orelhas serem puxadas em público, perguntou à idiota (que o era) se os filhos dela tinham a mesma média que eu, se eram, como eu, do topo das respectivas turmas, se eram, como eu, federado e medalhado em mais do que um deporto...enfim, se tinham o meu CV.
Ela respondeu que não mas que isso não justificava tudo...e ouviu que o melhor era deixar-me em paz porque não tinha nada a apontar além de não gostar de mim. Pois, deve haver muita gente que gostava de ter tido um K mas ele mora lá em casa (esta frase, ou algo parecido, foi-me contado por um gajo da minha turma que tinha lá a Mãe).

Há uns dias, fui praticar desporto.
Vou fazer uma descrição daquilo que me foi contado, sem a conclusão, para depois voltar ao mesmo tema e para que não seja o meu Pai o único culpado do buraco ou montanha que foi criada:
Então,
T-shirt de mangas cortadas, muito suado, cabelo molhado, calções de quando tinha, talvez, mais 25 kgs, e umas sapatilhas que deveriam ter entregado a alma ao criador há muito.
Atrás de mim vinha um casal com cerca de 50 anos e quando se iam aproximando o homem olhou para mim de cima a baixo, por trás, e quando se colocou ao meu lado olhou uma outra vez; trocou de lado com a mulher, que antes estava do meu lado, e colocou-se entre mim e ela e agarrou-a pelo braço (isto está em itálico porque me foi contado por quem estava comigo, eu só os vi uns 10 metros depois de terem passado).

Eu: ui ui, teve medo que a gaja se excitasse toda e me quisesse sacar?!
Ela: não, não me pareceu nada disso. Parece que pensou ui ui, se isto der merda ainda apanho na tromba porque olhou para ti assustado.
No dia seguinte, se bem me lembro, contei esta história à minha Mãe, sem as conclusões dela nem as minhas, só a história.

Mãe: Pois... ele devia ser inseguro e tu já eras bonito mas agora...

...e está explicado!

Porque me lembrei destas coisas?
Bem, lembro-me ciclicamente porque não consigo evitar tentar compreender para controlar mas, desta vez, há outro motivo.

Ontem recebi o que apenas pode ser entendido como uma boa notícia. Se a minha personalidade fosse uma outra coisa que não é a notícia teria sido óptima.
Pouco depois de a receber tive de verbalizar o ocorrido por questões profissionais que senti não poder evitar e verbalizei a conclusão desta forma: Vou optar por não ficar fodido.

Como se justifica isto?
Na minha cabeça, é bom mas não o que deveria ter sido; era o que eu pretendia mas não exactamente o que pretendia e nem foi entregue da maneira que eu entendo que deveria ter sido; o meu intelecto apreciou o feito mas o meu cérebro reptiliano não ficou satisfeito...nem durante 5 minutos.

Depois disto, em contexto social e não profissional, deram-me os parabéns mas perguntaram-me por que motivo não estava contente e a resposta é tão simples como isto: Nunca estou; nunca chega.
Se tivesse sido EXACTAMENTE o que eu queria e entregue EXACTAMENTE da forma como eu entendia que deveria ter sido é provável que ficasse contente durante, na loucura, um dia e depois voltava tudo ao mesmo.

Nunca chega.
Uma relação passada disse-me uma coisa que já por aqui escrevi mas que não deixou de ser verdade uns 8 anos depois: K, só te vejo feliz um bocado antes, durante, e um bocado depois e não estava enganada.
Há pouco tempo, disseram-me que gente do meu tipo ou tem uma carreira galopante, sempre, ou, volta e meia, dá tombos fodidíssimos e não estava enganada.

Depois, há o reverso da medalha, aquilo que também dói nos outros.
Não é fácil conciliar a ideia de que sou capaz de fazer tudo por outra pessoa enquanto sinto que merece e nada quando me parece que não recebo na medida em que deveria; não é uma medida de faço isto por ti tens de fazer isto por mim como aqueles idiotas que caem de boca nas gajas para, depois, elas chuparem, não é isso.
Não é uma medida de comparação. É eu preciso disto independentemente do que isto seja. Não aceito menos mas não exijo igual... e não aceito o que não aceito.

O que quero dizer, demasiadas linhas depois, é que não acho que a minha educação tenha sido errada, ainda que exagerada aqui e ali. Detestaria ter sido educado em baixa auto-estima; detestaria ser aquele coitado a quem tudo acontece e que não entende todos os males que lhe são infligidos; detestaria contentar-me com qualquer coisa só por ser suficiente; detestaria ser aquele gajo que se sente agradecido porque lhe dão alguma coisa, ainda que pouca; detestaria que dissessem que sou simpático ou boa pessoa de forma inócua, só porque não incomoda.

O que gostaria, contudo, era de ser um bocado como o buraco negro que não tapa independentemente daquilo que lá para dentro se atire.
O que gostaria era de ter mais paz ou, pelo menos, mais paz durante mais algum tempo.

É por isso que gosto tanto de músicas sobre redenção, porque não a vejo acontecer.
É por isso que rosno, de vez em quando, para não ser forçado a morder. Podem detestar o que faço ou fiz mas não que não avisei que iria acontecer.

Fica perto quem quer e quem quer tem de querer bastante porque, como diz o Zambujo no Zorro, foi ela que pediu.

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