Há uns tempos vi um documentário sobre arte e uma das perguntas que apanhei teve quer ver com a inexistência, actual, de grandes vultos da arte (estava- se a falar de pintura, no caso). A inexistência de gente, hoje, que avançasse e quebrasse barreiras.
A resposta, em geral, poderia ser simples e bastaria lembrar que os revolucionários actuais apenas são reconhecidos muito tempo depois de terem revolucionado; é mais ou menos uma revolução silenciosa cuja paternidade apenas é descoberta muito tempo depois.
Ora, o gajo a quem a pergunta foi feita tinha uma ideia diferente.
O que ele achava era que como hoje o diagnóstico e o tratamento são muito mais avançados e, concomitantemente, também o tratamento, o que faz com que os tidos como génios passados deixem de se encontrar em tempos hodiernos é que o que os tornava diferentes foi fazendo-os iguais.
É uma discussão muito mais antiga que o documentário.
A questão da necessidade/desnecessidade de drogas no processo criativo; a questão de transformar um desiquilíbrio mental em instabilidade (uma arte de figura de estilo); a questão do ser diferente entre os iguais e, quando apreciado, este diferente querer dizer melhor.
Isto lembra-me duas passagens que não sei exactamente de onde as tirei:
Então, se tivesses tratado o Van Gohg ele nunca teria criado aquelas maravilhosas pinturas!
- Não. O que aconteceria é que ele ainda teria a orelha.
Queres dizer que o Miles Davis não era brilhante porque estava drogado?!
- Não. O que quero dizer é que ele tocava melhor quando estava sóbrio.
Não sei responder nem clinicamente nem em termos de apreciador de arte a esta questão. O que posso dizer com segurança é que tudo se está a homogeneizar (começando pela tentativa de afirmar masculino x feminino como igual).
Será isso bom?
Em tese, será mas em concreto há mais dúvidas.
Para ilustrar isto, mais ou menos, sem entrar em temas demasiado polémicos, lembro-me, assim, de dois exemplos; um mais histórico e outro mais actual.
1
Há muitos anos atrás (não preciso porque não sei e não me apetece pesquisar) houve um gajo que foi dar a volta ao mundo numa altura em que tal era mais difícil mas em que já havia máquinas fotográficas.
Então, este gajo foi fotografando os lugares por onde passava e na altura em que, supostamente, não se vivia no individualismo e afirmação da singularidade dos indivíduos, era perfeitamente possível aferir de onde eram as pessoas analisando, apenas, as fotografias.
Depois, inventou-se, por exemplo, os jeans e tal distinção tornou-se impossível.
A luta pelo individualismo metamorfoseou tudo.
2
A Lady Gaga atafulha todas as suas músicas de referências ao cada um como cada qual e nasci assim e é assim que eu sou e cenas deste tipo.
Se, como eu, virem as pessoas (crianças?) que estavam a fazer fila para a ver, todas elas cientes da sua individualidade, terão atentado que era muito difícil distingui-las porque eram todas iguais.
Mais uma vez, como acima, a ideia da individualidade entra em conflito agravado com a realidade.
A dado momento do texto parece que me perdi...
Então,
Valeria a pena o Van ter mantido a orelha se tal evitasse a expressão da sua genialidade?
Para nós, não.
Para ele, sim.
Glória póstuma é glória nenhuma para o glorificado.
Seremos todos o mítico rebanho e será o gajo que se julga pastor o pastor de facto ou apenas mais uma ovelha que se vê distorcidamente ao espelho?
Não estou certo da resposta mas tendo a pender para a segunda.
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