Saturday, October 27, 2018

A VIDA EM COMPARTIMENTOS

Precisamos de compartimentalizar. É uma necessidade a bem da sanidade.
Precisamos de distinguir a vida profissional da pessoal. Ainda que seja impossível tornar os compartimentos completamente estanques como se de submarinos nos tratássemos, devemos fazer o melhor que conseguirmos...pelo mesmo motivo que se compartimentalizam os submarinos: se uma área de foder impede-se que toda a embarcação fique comprometida.

Coisa diferente é pensar-se que se compartimentaliza a personalidade (excluo, por desconhecimento, casos de patologia clínica em que, ainda assim, não se pensa em compartimentalizar...apenas se compartimentaliza).
Ser-se pessoalmente sério e profissionalmente o seu contrário, não existe;
Ser-se pessoalmente incapaz de ser pontual e profissionalmente pontual não se coaduna com ser pontual;
Ser-se pessoalmente irresponsável e profissionalmente responsável, é uma impossibilidade.

Ah, K, mas há gente assim! Há gente que na sua profissão é óptimo e na vida pessoal uma miséria!
Há.
Dá-se que esta gente não é as duas coisas. Esta gente pode parecer as duas coisas mas não o é. O que pode acontecer e acontece muitas vezes é que se finge uma delas mas ser-se apenas se é uma.

Pense-se, por se tratar de um caso muito irritante mas socialmente aceitável, na pontualidade.
A pessoa A chega sempre a horas ao emprego e nunca a horas a mais coisa nenhuma.
A pessoa A não é pontual. Facto. 
Então, por que motivo chega a horas a determinados compromissos e não a outros? 
As explicações podem ser várias:
A pessoa A dá mais importância ao trabalho do que às pessoas;
A pessoa A não quer ver ser-lhe cortado vencimento por se atrasar;
A pessoa A não quer ser despedida;
A pessoa A está imbuída de temor reverencial pelos superiores hierárquicos;
A pessoa A pensa que apenas há consequência para o atraso ao nível profissional.

A pessoa A chega a horas porque
A pessoa A não chega a horas por estar na sua natureza cumprir; o que está na natureza da pessoa A é temer consequências de não cumprir.

Se uma determinada pessoa não é igual em todas as circunstâncias será essa a sua característica e será essa a pessoa que é.

Ah, K, isso é estúpido! Todos temos de nos comportar de uma determinada maneira em determinada circunstância e de outra noutra!
Certo.
Não invalida o que disse.

Eu detesto usar fato mas já tive de usar muitas e muitas vezes.
Eu detesto usar fato quando o visto e quando não o visto, é igual, sou o mesmo.
Quando o uso, estou a ser forçado a isso - diga-se, deixei de usar porque sou espectacular e pensei ah, foda-se! - e dói-me mas o que nunca me ouvirão dizer é:
Eu gosto de usar fato. Só não gosto de usar fato quando não estou a trabalhar.
Não.
A afirmação certa é eu não gosto de usar fato.

Será que me faço compreender?
A diferença é pequena mas está lá.
A diferença entre ser-se atropelado ou não ser-se atropelado também pode ser de 2 segundos. Um hiato temporal minúsculo mas que faz toda a diferença.

- AINDA MEIO DENTRO DO ASSUNTO - 

Quem priva comigo em carne e osso tende a pensar que sou um animal muito rápido a julgar os outros e a distribuir castigos;
Quem priva comigo por cá há-de ter notado que tenho muitas dúvidas quanto a prós e contras em todas as circunstâncias porque me esforço por entender.

A verdade, aqui, não está no meio.
O que acontece é o seguinte:
Eu tenho um imenso interesse por perspectivas e resultados. Interessa-me o que leva uma pessoa a fazer isto e outra a fazer aquilo. O que faz um criminoso cometer um crime e como a sua personalidade de moldou para lá chegar.
Dito isto, não tenho qualquer problema em fazer descer o cajado, independentemente da empatia que possa criar com quem quer que seja,

Por exemplo:
uma pessoa que seja criada por pais alcoólicos e prevaricantes vê as hipóteses de o ser também dispararem.
Mas este potencial alcoólico e prevaricador deve ser, independentemente disso, castigado porque quem ele agredir ou roubar não tem culpa nenhuma do que lhe aconteceu.

Acredito que o que me distingue de muita desta esquerdalha aparentemente compreensiva não é o raciocínio, é a acção.

Eu posso pensar mas seguramente ajo.

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