Monday, July 31, 2006

Vácuo


A imagem mais triste que guardo é a de um funeral.
Foi uma imagem que me deixou pregado ao chão, de mãos atadas e a pensar se queria ou quero aquilo pra mim.
Há uns anos, poucos, faleceu a avó de um grande amigo e eu, que até conhecia ambos os avós mas por respeito a uma amizade, fui ao velório fazer o "corpo presente" e o "se precisares já sabes" e depois passar o mais possível por baixo do radar.
Companheiros que o foram, de facto, até que a morte os separou.
Quando vi o "homem" prostrado e perdido a olhar pró caixão quase senti a terra girar em meu torno.
O ar perdido daquele ser, a forma como se lia nele que acabara de perder o rumo, a angústia calada e inerte ao lado do sarcófago....foi demais pra mim.
Quando alguém se entrega uma vida inteira daquela maneira confundem-se vidas e, acredito, batimentos cardiacos.
É de uma violência atroz ver o dia a dia morrer e ver-se amputado, eventualmente, da melhor parte do seu corpo....a que vivia autónoma mas ainda assim dependente.
Deu-me o medo que sempre me acompanhou.
O medo de que nada é eterno, até porque existe a morte.
O medo de se entregar de corpo e alma e um dia ficar sem qualquer uma das duas.
O medo de sentir morrer enquanto ainda se respira.
Foi muito agressivo para mim.
Não me lembro de nada que se me tenha entranhado tanto na alma.
Isso do "um dia de cada vez" é uma balela...o amanhã sempre me preocupou muito.
A "Arte do Dar" é algo que estou a aprender, não nasceu comigo.
Mas sempre que me lembro do espectro do fim arrepio-me de ponta a ponta.

1 Comments:

Blogger Pandora said...

Há gente com muita sorte sim, sou uma delas por existir quem mereça e zele por ter a chave!


Beijos...

6:21 AM  

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