Wednesday, October 09, 2013

Diamantes de Sangue - Rafael Marques

Por conta do que anda a dizer e a fazer o Machete lembrei-me, mais uma vez, de Angola.
Para rematar esta reminiscência, vai sair agora (ou já saiu) um filme sobre a vida de Hanna Arendt, uma das minhas autoras favoritas.

O que têm estas duas coisas em comum e como se enquadra aqui o livro do Rafael Marques?

Li o referido livro há uns tempos e se como livro não é a coisa mais à frente que já li (e não é mesmo...), a imagem da realidade foi mais chocante do que aquilo que previa.
Parte do livro refere os abusos das forças de segurança (tanto das FAA como dos mercenários) sobre os garimpeiros. Envolve assassinatos, torturas e abusos de todo o tipo.
A parte que não me chocou muito foi:
As forças de segurança matar e maltratar os garimpeiros porque queriam o que eles tinham. Quer isso fosse dinheiro quer isso fosse os diamantes que encontravam.
Apesar de ser, evidentemente, vergonhoso, é algo que consigo compreender. Consigo compreender que se use força para se roubar. Acontece em todo o mundo, com uma maior ou menos violência. Não é necessário um enorme esforço intelectual para entender.
A parte que mais me chocou foi:
Parte dos abusos que referi nada tinham que ver com roubo. Parte dos abusos não tinham qualquer fim que eu consiga entender. Parte dos abusos é um neo-colonialismo ou escravatura clássica.
Foram contados casos em que as forças de segurança apanhavam um grupo de garimpeiros e obrigavam-nos a lutar uns contra os outros, nus, ou a colocarem as mãos no fogo para ver quem aguentava mais tempo...sendo que quem aguentasse menos...
Não tinha outra finalidade além da violência em si mesmo. Não queriam nada. Não levavam nada além da dignidade das pessoas e a dignidade não se troca, depois, por arroz.

Foi nesta última passagem que me lembrei da Hanna e da banalidade do mal.
É chocante aquilo que as pessoas passam a entender normal, especialmente quando é, digamos, ratificado pelos seus superiores.
Pode ser a minha pele que seja já demasiado dura para ficar surpreendido quando alguém magoa para se apropriar do que quer que seja. Mas ainda não é demasiado dura para ficar pasmado quando alguém magoa apenas para magoar, sem segundo sentido ou plano ou benefício.

E depois, o Machete vem pedir desculpas por importunarmos angolanos. Ou melhor, dirigentes angolanos porque os angolanos são outra coisa.
Não se pense que estou aqui a reencarnar a Madre Teresa. Não faço parte dos idiotas que entendem que devemos recusar qualquer contacto com o regime de lá com base em princípios porque, bem vistas as coisas, teríamos de cortar relações com quase todos os países (onde se inclui os honrados EUA) e o dinheiro, que não tem cheiro, iria para outro lado fazer a mesma coisa com a mesma intensidade e com os mesmos favores.
Mas, que diabo, dar o rabo é um bocadinho de mais...

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