Thursday, March 22, 2012

Emigração

É um assunto que voltou a ser recorrente, 20 ou 30 anos depois.
Por princípio não encontro qualquer problema, na verdade, é algo em que penso há imenso tempo mas só recentemente lhe vi a parte horrível.
Não falo das saudades ou do desconhecido, nenhum destes problemas se me apresentou como novo nem me preocupa em demasia. Conheço ambos e sei, perfeitamente, que tenho perfil para aguentar.

A questão que não conhecia, porque nunca me havia acontecido nem pensado nela, começou a delinear-se, sem que por isso tivesse dado conta, há coisa de uns meses quando se iniciou o périplo de idosos encontrados mortos em casa. Quando digo "sem que por isso tivesse dado conta" foi porque lamentei, naturalmente, as ocorrências mas não as liguei, imediatamente, à questão da proximidade.
É de notar que estas situações se têm dado em centros citadinos. A alienação cosmopolita levou a que desaparecessem pessoas sem que por isso se tenha dado conta. O mesmo cosmopolitismo policromático de que tanto gosto, a mistura de raças e de credos que tanto me agrada traz consigo o fétido cheiro da alienação (quando saio das metrópoles - se é que as temos - surpreende-me que me digam "olá" sem que os conheça...agrada-me mas surpreende-me).

Recentemente perdi um elemento familiar. Era idoso e já contávamos que o fim estaria ao virar da esquina, daí ter sido menos doloroso do que se fosse de um momento para o outro.
Independentemente disso, caso nós (a família mais próxima) não estivessemos por perto tudo teria sido pior para a idosa que sobreviveu. Não sei quanto mas muito pior...no entanto, com a proximidade, tudo foi mais mitigado, houve muito mais apoio e o facto, apenas, de estarmos por aqui, à distância de uma chamada, ajudou a que a península não se tornasse ilha.

Com esta pequena história, que nem sequer é parábola, quero dizer que o mundo capilatista que me vendem e que comprei, sem reservas, pode sofrer de um mal que apenas a maturidade revela. A maturidade e a inevitabilidade da finitude.
É verdade, ontem como hoje, que é sempre melhor ter dinheiro: rico e com saúde é sempre melhor que pobre e doente, é evidente; mas a alienação é como um cancro que vai metastizando de uma célula para outra e o capitalismo é a maior das suas vitaminas.

Não, não virei à esquerda.
Não, não acho que o capitalismo é o mal que tudo corrompe.
Agora... não é tudo. E isso descobre-se da pior maneira.

Monday, March 19, 2012

Como Nos Destroem

O título é um pouco exagerado. Seria mais justo dizer "como nos fodem" ou "como nos estragam" ou "como nos incapacitam", no entanto, quando a poeira assentar, talvez seja mais verdadeiro o "destruir" embora neste momento possa parecer algo dramático.

É profundamente injusto que nasçamos novos e inexperientes. Deveriamos ter, à partida, um manual ou um chip que nos orientasse em termos básicos mas definitivos. Seria muito útil que soubessemos, desde a mais tenra idade, que a mentira é uma moeda internacionalmente aceite, que os nossos pais não são perfeitos mas apenas uma imagem, distorcida ou não, daquilo em que nos iremos tornar e que se a mãe da nossa mulher/namorada for insuportável a coisa tenderá a seguir o mesmo caminho com o pintainho que veio daquela galinha.

Já viram o que se poupava?
Iriamos ter menos delinquentes, menos gente esmorecida, menos incapazes...
Não se pense, contudo, que culpo tudo na educação. Não penso que possamos escusar-nos à responsabilidade que também é nossa. Não penso que os pais ou educadores sejam umas bestas que andam aí para nos marcar para o resto da vida, acredito, isso sim, que fazem o melhor que conseguem (a maioria, pelo menos) só que, muitas vezes, é insuficiente.

O problema é que o efeito é parecido com aquele de mandarmos uma pedra para a água em que os aneis começam pequenos mas vão crescendo exponencialmente. O pequeno agiganta-se e, al algumas ocasiões, ocupa o lago todo.

Nada disto me surge como novo, já descobri estas evidências há algum tempo...mas voltamos a uma "piada" que escrevi aqui há algum tempo em que o Pessimista diz que isto não pode piorar e o Optimista responde "ah pode pode!!"

Saturday, March 10, 2012

A Ignorância

Há uns dias o Rick Santorum, em mais uma das suas brilhantes e modernas prestações, chamou o Obama de elitista e snob porque, há uns anos atrás, este último disse que gostava que mais americanos tivessem oportunidade de ir para a faculdade e adquirir mais instrução.
Não perderei tempo, porque não é isso que me trás aqui hoje, a comentar esta idiotice e as outras idiotices que se seguiram relativamente a este mesmo assunto. Hoje o interesse é outro mas entronca aqui.

Ontem tive uma reunião com uma tipa da Segurança Social e, por vários motivos, não me apeteceu ir fardado (a.k.a. de fato).
Fui falar com a dita Sra. porque tinha dúvidas relativamente a uma determinada situação que, segundo me pareceu, ela não tinha esclarecido devidamente uma familiar meu. Ora, o que se faz quando se pretende ver dúvidas esclarecidas? Faz-se perguntas, evidentemente.
Acontece que esta Sra., como muitas outras, não é caso único, entendem perguntas como "agressividade" e "desconfiança" (disse-me, expressamente, que eu lhe parecia agressivo...o que poderia até ser verdade, sou capaz disso, mas, naquele caso, não era). Quando, a meio da conversa, que estava claramente, a azedar, lhe disse que tinha um determinado curso superior, deixei, imediatamente, se ser agressivo. Foi um passe de mágica incrível. Não surpreendente, afinal, isto é muito português, mas que eu achava relativamente ultrapassado.

Voltamos, então, ao primeiro parágrafo.
Hoje em dia, graças à instrução que, melhor ou pior mas seguramente mais extensiva, é administrada (e vou, apenas, até ao secundário), o português médio é mais acessível e mais educado. Nota-se de uma forma absolutamente evidente na polícia (tanto PSP como GNR) mas também nas lojas e nos enfermeiros e por aí fora.
O que eu encontrei não foi um Portugal inexistente mas um muito mais exíguo, em vias de extinção, em que as pessoas entendem questões como ameaça e que apenas se dão ao trabalho de ser educadas quando perante um fato ou um diploma.

Instrução não é uma ameaça nem snobismo nem elitismo.
Instrução é justiça e democracia.

Thursday, March 08, 2012

O Gelo

É muito desagradável o momento em que descobrimos que somos incrivelmente mais insensíveis do que deviamos ser. Aquele momento em que já estamos imensamente desligados mas que ainda não o estamos completamente; aquele momento em que ainda temos consciência do que devia ser e sabemos que já não é.

Nunca fui um tipo sensível do tipo que chora com filmes ou que tem muita pena de animais abandonados. Reconhecia o sofrimento e percebia que era de lamentar, sentia-o, reconhecia que não se devia jamais abandonar animais, parecia-me, mais que injusto, cruel.
Com o passar do tempo, contudo, o meu sistema nervoso foi sendo endurecido, tanto pelo que vi como pelo que vivi, e apesar de continuar a reconhecer e lamentar aquilo que considero injusto fui sentindo que sentia menos.

Poderia isto ser uma demonstração de um profundo egoismo e narcisismo? Não. Apesar de não negar o meu egoismo e narcisismo não era isso. Este afastamento que está a um passo da misantropia não floresceu porque eu ganhei um imenso interesse em mim mas porque fui perdendo interesse em geral.

Quando vemos ou ouvimos alguém que deveria ser o mais próximo possível em pranto a reacção deve ser se consternação ou algo semelhante, do tipo "I feel your paine!" e eu sei isso também e porque sei manifesto isso mesmo mas, na realidade, bem lá no fundo, não foi o que aconteceu. Poderia dizer que é a paga do que se fez antes, e não seria mentira; poderia dizer que a vida é fodida para todos e isso seria meia verdade.
Agora, o que realmente aconteceu?
Movi-me pelo que devia ser e não me arrependo porque se me tivesse movido pelo que sentia apenas iria juntar pranto ao desespero.

Thursday, March 01, 2012

Barbies

Há umas semanas atrás passei-me um bocado porque o Presidente da República disse-nos que tinha dificuldade em fazer face às suas despesas apenas com 10.000,00€ mensais. A tempestade para ele parece ter passado mas a minha onda ainda espuma.

Este fim-de-semana que passou, contudo, vi algo de semelhante mas imensamente menos grave porque foi uma antiga manequim e actual apresentadora de televisão (?) e empresária (?) que a escreveu.
Estava a ler a Notícias Magazine, a revista de fim-de-semana do JN (que acho óptima, diga-se) quando dei de caras com a rubrica de moda da Marisa Cruz. Ultrapassado, muito rapidamente, o sofrível português e o emaranhado de clichês (é mulher do João Pinto, antigo jogador da bola e, por isso, um dicionário deste tipo de coisas) dei conta de que a antiga bela Marisa é absolutamente fã de uma carteira da Chanel.
Problema? Nenhum!! Acho óptimo que as pessoas tenham paixões, sejam elas quais forem.

Agora, o que se seguiu, ou antecedeu, não me lembro, é que a querida Marisa entende que esta carteira é um must have em qualquer guarda roupa. Ouviram? Must Have!!! E embora a nobilíssima advisor compreenda que talvez 1.900,00€ (sim, é o preço da carteira) possam parecer muito dinheiro na verdade não são porque esta carteira vai bem com tudo!!

Se esta mulher dissesse à Rania da Jordânia isto eu não acharia nada estranho...excluindo o facto da Rania falar com a Marisa...mas dizer num artigo de um jornal absolutamente comercial que 1.900,00€ numa cena para transportar umas cenas é um bom investimento e um must have é paupérrimo e de mau gosto.

Enfim...