Não foi a primeira vez que ouvi isto mas também não é muito frequente. Talvez fosse uma frase mais recebida pelos meus ouvidos se fosse o tipo de pessoa que dá abertura para que teçam comentários a seu respeito...não sou.
Vou - para que não restem dúvidas" - esclarecer que não aproveitas o teu potencial é um eufemismo para devias ser mais bem sucedido profissionalmente o que, por sua vez, é um eufemismo mais leve para devias ganhar mais dinheiro.
...não é coisa que nunca me tenha ocorrido mas o meu caminho não é esse.
Porquê?
DA REALIDADE
Durante um período significativo da minha vida fui bem sucedido.
Em criança, o melhor aluno até ao (talvez) 10º ano;
Em adolescente, entre os 5 melhores alunos até ao 12º ano;
Em adulto, nunca falhei nenhum ano na Universidade (isto não é muito mas, naquela altura, a medida de sucesso a que me propus foi esta porque tinha muita bebida para beber, muita gaja para comer e muita noite para virar).
Em criança e até ao fim da adolescência fui um atleta de topo em tudo aquilo a que me propus e, depois - como aconteceu na faculdade -, quando cheguei à idade adulta passe a ter todas as coisas já descritas para fazer.
Em adulto, talvez até aos 30, fui o gajo mais novo entre os que conhecia que tinha um departamento sob direcção e fechei alguns negócios com relevo (um deles que se traduziu num rendimento - ainda hoje! - superior a 4 anos de trabalho).
Fui dando conta, durante este período, de coisas esquisitas e que me chateavam:
Nenhum dos meus sucessos me deixava (e não deixa) particularmente contente ou, talvez mais correctamente, nenhum dos meus sucessos me deixava contente mais que meia dúzia de horas.
Quando falava - podia usar o verbo no Presente - sobre a minha vida, muito raramente (ou nunca) tinha nada a dizer daquilo que tinha conseguido; só os falhanços me ocupavam a memória.
O sucesso não me diz coisa nenhuma porque o que é bem feito não merece reparos.
O falhanço mostra as limitações e incapacidades que temos, algo de muito mais relevante.
Certo?
Bem...é certo mas não é bom.
No fundo, ser bem sucedido não me trazia felicidade.
Mandar em gente, comprar carro, ser olhado com admiração não me furava a pele mas era tudo o que conhecia e era tudo o que queria.
DA TEORIA
As pessoas que não têm de conviver comigo têm-me em melhor conta quando vêm aquilo que tenho de semelhante com todas as bestas bem sucedidas no Mundo.
Ficam impressionadas quando tudo é força e fogo e vitória. Ficam admiradas quando muros são derrubados e não há sangue que me assuste ou tolha a visão (uma vez, parti a cabeça a meio de um jogo - vim a levar 10 pontos por cima do olho - e só saí do campo quando obrigado para estancar; quando cá fora, ouvia-se caralho, ata essa merda depressa, estamos a perder tempo! para o enfermeiro...e depois voltei sem qualquer posterior cuidado).
Nada disto é mau, certo?
Bem...errado.
Esta minha sede e esta minha incapacidade de temperar dá péssimos resultados e não fazia de mim a pessoa que queria ser.
Esta força de vontade que não conhece dor nem distância mas apenas meta foi a mesma que destruiu todas as relações que tive; esta força de vontade que não conhece dor nem distância mas apenas meta foi a mesma que pôs a minha mãe a chorar porque fui bem mais agressivo com as palavras do que devia; esta força de vontade que não conhece dor nem distância mas apenas meta foi a mesma que me pôs a pisar a cabeça de um gajo.
Eu não quero ser isto mas, a triste verdade é que sou.
Pedirem-me para ser bem sucedido é empurrar-me para um lugar onde eu sou bom mas que faz de mim mau em todos os outros aspectos.
Infelizmente, ainda não foi possível ensinar à humanidade que só em filmes de merda é possível cortar e colar partes de personalidades para construir uma pessoa.
Mas não é só isto: quando somos esta coisa, somos mais fáceis de manipular.
É verdade que é precisa alguma coragem para tentar manipular quem não gosto de o ser porque, quando descoberto, vai haver um inferno sem nome para enfrentar mas, ainda assim, é uma fraqueza.
Por natureza, não recuo perante desafios, pelo que é muito fácil desafiar-me. Ora, mesmo que eu ganhe o desafio e mesmo que quem me desafie pague caro por isso, a verdade pura e simples é que conseguiu o que quis e eu não.
A minha personalidade tem muitos problemas...
Eu não me dou bem com desilusão;
Eu não me dou bem com falhanço;
Eu não me dou bem com frustração.
Ah, K, nisso és como toda gente, imbecil! poderão dizer e estarão carregados de razão. O problema é que, comigo, tudo é mais rápido e mais forte e, potencialmente, inultrapassável (ainda hoje, volvidos praí 4 anos, penso no filho da puta do arrumador que não levou na boca e devia ter levado).
Só para que não pareça que tenho todas as respostas, não descuro a hipótese de tudo isto ser uma construção destinada, apenas, a não me esforçar. Coisa do tipo ah, não consigo mas também não tento!.
Coloco sempre em cima da mesa todo o tipo de hipocrisia.
...só que eu nunca evitei competição.
Odeio perder mas não admito ficar de fora só porque poderei perder.
....e, para terminar mais ou menos como se começou:
Eu ODEIO perder mas não morro de amores por ganhar.